sexta-feira, 25 de maio de 2012

Adoção: vidas que se cruzam, vidas que mudam

Há 10 anos foi instituído o Dia Nacional da Adoção como proposta para se ampliar e se profissionalizar as discussões sobre o tema

Brasília  - Adotar, palavra que, conforme o dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, significa tomar alguém legalmente como filho, dando-lhe direitos. Na prática, muito mais do supõem os escritos oficiais, a adoção envolve sentimentos verdadeiros de união entre as partes. E basta arriscar uma pequena olhada adiante para se perceber o real valor da palavra para pais e filhos adotivos. “Desde solteiro sempre nutri uma vontade de adotar, tinha e tenho simpatia pela causa. Quando eu e minha esposa encontramos o Cléber e vivenciamos sua alegria, não imaginávamos o quanto nossa vida seria diferente a partir de então”, revela João Matos, pai adotivo e secretário-executivo de Articulação Nacional do Governo de Santa Catarina.

Na época da adoção, 1987, Cléber era bebê, oriundo de família pobre, negro, e com aparência muito diferente dos três filhos biológicos de João. No entanto, nada foi empecilho para o acolhimento no berço familiar já constituído, sem diferenciação de direitos, deveres e, principalmente, amor. “Hoje sei que ele não veio a nós por acaso. Seus 15 anos de vida transformaram a existência de muitas outras crianças”, fala o pai, referindo-se a motivação que teve para, como deputado federal, batalhar pela concepção de uma legislação específica para a adoção.

Vítima de tumor no cérebro, Cléber faleceu em 2001. No mesmo ano, João Matos fundou a Associação Catarinense de Pais Adotivos (Acapa) e apresentou no Congresso Nacional o projeto para criação da Lei Nacional da Adoção. “Ainda estava abalado, sentindo falta do sorriso do meu filho, que era a alegria da casa. Com aquele sentimento de nostalgia dentro de mim, pensei: ‘Filho, o pai vai continuar lutando por você’. E consegui forças para mobilizar os demais deputados”, lembra.

Sua primeira conquista foi a instituição de uma data na qual se discutisse amplamente e profissionalmente a questão da adoção. Há 10 anos, em maio de 2002, a lei 10.447 foi sancionada e o dia 25 de maio se tornou oficialmente o Dia Nacional da Adoção. Seguindo em frente, João criou a Frente Parlamentar da Adoção, com mais de 130 deputados inscritos, alicerce para as discussões de legislação específica no Senado Federal e na Câmara dos Deputados. “Começava ali seis anos de muitos debates, com audiências em todo o país e engajamento de profissionais de diversas áreas”, recorda.

Finalmente, em 03 de agosto de 2009, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou o texto final da Lei Nacional da Adoção (12.010), batizada de Lei Cléber Matos, em sua homenagem e em reconhecimento ao esforço de seu pai adotivo. No pronunciamento, Lula lembrou “o brasileiro que veio ao mundo negro e pobre e foi acolhido pelo deputado João Matos”. Para ele, a iniciativa foi “exemplo de solidariedade e inspiração para sancionar a lei que nasceu com o sentimento mais nobre que existe: o amor entre os seres humanos”.

Entre outras determinações, a Lei Cléber Matos tornou o processo de adoção mais transparente, criou o Cadastro Nacional da Adoção, convencionou que irmãos não podem mais ser separados e apontou a necessidade de preparação psicossocial para todos os pais adotivos. Hoje, passados três anos, João Matos percebe avanços em diversos pontos, mas reconhece que a burocracia ainda atrapalha o sonho de adotar e ser adotado. “Antes da lei tínhamos regras diferentes em cada estado e isso não existe mais, ficou mais fácil realizar o sonho de pais de crianças. Porém, vejo que os pretendentes continuam procurando os menores de dois anos e brancos, quando a realidade nos abrigos é outra: a maioria tem mais de cinco anos, é negro e do sexo masculino”, finaliza.

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